domingo, 14 de março de 2010

A DIVERSIDADE NA UMBANDA

A Umbanda é uma religião que tem um conceito – atribuído ao Caboclo da Sete
Encruzilhadas, seu fundador/nominador-aceito universalmente pelos seus membros.

Conceito: Umbanda é a “Manifestação do espírito para a caridade” .

Cem anos atrás, bem antes talvez, a prática da Umbanda já existia, embora
inominada e exercitada em Roças de Candomblé (embora não fossem bem aceitas as
suas manifestações), Terreiros de “Macumba”, em quartinhos nos fundos das casas e
em locais isolados no interior do país, e outros locais com outras denominações onde
se manifestavam esses espíritos.

O feito mais importante do Caboclo das Sete encruzilhadas foi a anunciação e o
”batismo” da nova religião com o nome de Umbanda, a expressão pública da sua
missão, a implantação efetiva e definitiva da nova religião para o mundo físico, não
como uma ocorrência isolada e deslocada em centros kardecistas, Candomblés,
Macumbas, etc... mas como uma “nova” forma de trabalho com a espiritualidade,
cujas primeiras diretrizes fez saber a quantos ali estavam.

Nesse artigo desenvolver-se-á uma teoria sobre o assunto, que não tem a pretensão de
ditar normas ou ser a verdade das verdades, mas de analisar o conceito e suas
implicações.

Partindo do próprio conceito que diz :
“Manifestação do espírito para a caridade” e o
analisando pela ótica da interpretação, pode-se chegar a algumas deduções, que serão
relatadas a seguir.

Quando o conceito fala em “manifestação do espírito”, está especificando que
deve/pode haver esse tipo de manifestação, dentro dos trabalhos da Umbanda.
Quando diz que é “para a caridade” está informando/afirmando a grande condicional
necessária e imprescindível para que esse trabalho dos/com os espíritos seja
considerado como de Umbanda: a prática da caridade.
Atribui-se também ao Caboclo das Sete Encruzilhadas a informação de que essa seria
uma religião para todos: encarnados e desencarnados, de todas as raças, credos e
condições sociais. Sem discriminação.

O Caboclo pergunta aos seus interlocutores kardecistas :
(...)"- Porque repelem a presença dos citados espíritos, se nem sequer se dignaram a
ouvir suas mensagens. Seria por causa de suas origens sociais e da cor?"
"- Se julgam atrasados os espíritos de pretos e índios, devo dizer que amanhã estarei na casa deste aparelho, para dar início a um culto em que estes pretos e índios poderão dar sua mensagem e, assim, cumprir a missão que o plano espiritual lhes confiou. Será uma religião que falará aos humildes, simbolizando a igualdade que deve existir entre todos os irmãos, encarnados e desencarnados. E se querem saber meu nome que seja este:

Caboclo das Sete Encruzilhadas, porque não haverá caminhos fechados para mim."(...)
: "- Assim como Maria acolhe em seus braços o filho, a tenda acolherá aos que a ela
recorrerem nas horas de aflição, todas as entidades serão ouvidas, e nós
aprenderemos com aqueles espíritos que souberem mais e ensinaremos aqueles
que souberem menos e a nenhum viraremos as costas e nem diremos não, pois
esta é a vontade do Pai." (...)

"-Aqui inicia-se um novo culto em que os espíritos de pretos velhos africanos, que haviam sido escravos e que desencarnaram não encontram campo de ação nos remanescentes das seitas negras, já deturpadas e dirigidas quase que exclusivamente para os trabalhos de feitiçaria e os índios nativos da nossa terra, poderão trabalhar em benefícios dos seus irmãos encarnados, qualquer que seja a cor, raça, credo ou posição social. A pratica da caridade no sentido do amor fraterno, será a característica principal deste culto, que tem base no Evangelho de Jesus e como mestre supremo Cristo".

Foram sublinhados determinados trechos no texto acima apenas para dar ênfase ao
que se pretende demonstrar, ou seja, que a Umbanda, por sua natureza e por sua
conceituação e definição, é uma religião onde a prática da caridade e do amor fraterno é a prioridade e a meta, que nela não pode existir preconceitos de quaisquer espécie,
sejam relativos aos encarnados ou aos desencarnados, que sua função é permitir que
os espíritos e os homens possam auxiliar-se uns aos outros na senda da evolução.
Que se ensine o que se sabe e se aprenda com o outro o que não se sabe ainda. Que
se perceba que somente o amor e a fraternidade podem levar o ser à Luz . Que se
compreenda que nada, nada mesmo, acontece sem que o Astral Superior saiba e
permita.

Que o Pai sempre nos abençoa com recursos que facilitem nossa evolução e nos
espera de braços abertos quando estivermos prontos à retornar ao seu seio. Que a
Divina Luz zela pelos seus filhos todo o tempo, que tudo compreende. Que o Senhor,
tudo vê, sabe e pode; e que não há no universo o que não seja por Ele gerado,
coordenado ou por suas Leis regulado.

Deve-se observar que, se no texto, o Caboclo inicialmente se refere aos pretos velhos
africanos e aos índios nativos, é porque, àquela época, esses eram os espíritos que já
se encontravam prontos para manifestação e a caridade, e não porque outros não
pudessem ser agregados a medida que suas falanges surgissem e estivessem prontas para o trabalho. Sendo evolutiva e agregadora, a Umbanda vem abarcando em seu seio amoroso uma série enorme de espíritos, formadores de novas falanges,
possuidores dos mais diversos conhecimentos, experiências e usos de processos
magísticos ; provenientes das mais diversas origens ( raciais, sociais e religiosas) que
estão dispostos a trabalhar fazendo caridade em busca de sua evolução e no auxílio da evolução do outro.

Do exposto acima surgem alguns itens a observar como, por exemplo, a questão das
novas falanges que vem surgindo na Umbanda, das variantes ritualísticas e das
diversificações de elementos magísticos usados por cada entidade.

Outro ponto que deve ser observado e com cuidado é a relação entre os cultos afros
originais, o Candomblé e a Umbanda. Se de início, talvez até, movidos pelo momento
histórico-político-social e pela necessidade de afirmação da Umbanda enquanto
religião diferenciada tanto do kardecismo quanto do Candomblé, os intelectuais da
Umbanda, de certa forma tenderam a torná-la um tanto rígida, se usaram de um certo
“purismo elitista” e de muito etnocentrismo, isso deve ser entendido dentro do
contexto do momento em que estavam e não como uma forma de dogma, ou de
intolerância. Deve ser levado em conta toda a criação/educação que receberam e o
meio social em que viviam, que era escandalosamente preconceituoso, se levarmos em conta a título de paralelo, os dias atuais.

Deve-se lembrar que a primeira reação de uma “cisão” religiosa entre outras tantas é a de negação do que se tinha anteriormente, ou seja, se de início negaram qualquer
ligação entre a Umbanda e os cultos de Nação, e, se a negação foi menor no que tange ao kardecismo, isso se deveu muito mais à questões das visões pessoais, crenças internas arraigadas, e principalmente do pensamento sócio-político reinante na época, do que à alguma regra da Umbanda ou da espiritualidade.

É preciso também entender que a Umbanda é uma religião de enorme abrangência
espiritual, capaz de unir sem conflitos os espíritos provenientes das mais diversas
fontes e aprendizados religiosos, dos mais diversificados rituais sem com isso se
tornar menos Umbanda, sem perder sua característica principal, a manifestação do
espírito para a caridade.

Os “erros” cometidos em nome da Umbanda são dos seres encarnados, que presos aos conceitos apreendidos na carne, aos sistemas sociais/religiosos onde foram criados, e sendo por suas próprias naturezas seres em evolução, muitas vezes, mesmo imbuídos das melhores intenções e do maior amor, acabam deturpando, ou antes, reduzindo a grandeza da Umbanda ao querer limitar e dogmatizar seus princípios, reduzir seus horizontes e sua competência.

No entanto, é preciso ter cuidado para não fazer como o fizeram os apóstolos após a
morte do Cristo, que ao invés de apenas seguirem seu exemplo de simplicidade e
humildade, e pregarem a boa Nova como lhes foi ordenado, deixaram falar mais alto
seus dogmas, seus preconceitos entranhados pela educação judaica na qual foram
educados e que lhes estavam arraigados ao ser.

Nessa jornada, “distorceram” muitos dos ensinamentos, deturparam princípios,
alteraram conceitos e principalmente esqueceram qual era a mensagem principal:
Todos somos filhos do mesmo Pai que nos espera e perdoa amorosamente.

Transformaram o messianismo e a simplicidade do Cristo em regras rígidas, seu
perdão tão gratuito em condicionamentos e penitências, suas parábolas ditas ao ar
livre em reuniões ritualísticas e repetitivas em templos fechados onde de início nem
todos são convidados a entrar para ouvir.

Sua humildade viu-se alterada e coberta do que é “de César”: riqueza material, poder
mundano acrescidos do controle sobre a consciência dos outros.

Que se possa aprender com os erros alheios do passado e do presente, nossos e dos
outros, principalmente sabendo que tais erros foram cometidos, não por maldade ou
premeditação, e sim por amor, com a crença de ser o ‘senhor” da Verdade, e um amor
capaz de fazer aceitar a morte nas cruzes romanas e nos circos, com a serenidade dos
que crêem-se e sabem-se amparados.

Que se possa compreender e admirar a diversidade daqueles a quem o Cristo pregava, lembrar que Ele não escolhia local nem hora, nem público especial, ele apenas saía e ensinava, curava e plantava a semente do amor nos corações dos homens, a cada um dando conforme sua capacidade de entendimento, sem criticar, sem condenar, apenas amando, perdoando, exemplificando, doando-se.

Que a Umbanda com seus mais diversos rituais, suas mais diferenciadas formas de
trabalho, suas múltiplas falanges, seu leque de opções magísticas usadas para
cumprir sua missão espiritual, permitindo a manifestação do espírito, qualquer
espírito, desde que para a prática da caridade.

Que seus adeptos confiem no Astral Superior, em Deus, não importa por qual nome O
chamem.

Que cada um confie em seus guias e permita que os outros confiem nos que lhe são
afeitos, e possam seguir seus caminhos conforme seus espíritos e suas mentes
estejam preparados para compreender a Umbanda e nela trabalhar.

Que os umbandistas sejam convictos de que seus mentores sabem mais e melhor do
que seus médiuns o que fazer pelo adiantamento de cada um, quais são os caminhos
que cada um tem que percorrer para evoluir.

Cada ser tem sua forma própria de ser e de aprender, seu tempo e método individual
de apreensão de conhecimentos e conceitos. Cada um de nós tem pelo menos uma
habilidade que sempre é utilizada (pelo astral) da melhor maneira possível em
benefício de si e do próximo.

Deixe-se de lado, o mais possível as pretensões tão humanas quanto a saber a verdade Suprema sobre a Umbanda e a vida e reconheça-se que o Pai, conhecendo a natureza dos que nessa terra encarnam, não deixaria que Verdade Suprema fosse conhecida integralmente por nenhum de nós, já que o poder é um grande corruptor de almas, e que tende-se a usar desses conhecimentos em proveito próprio (mesmo quando se tem, a melhor das boas intenções!), pois sempre se acha bem no íntimo que a “nossa“ forma de ver o mundo é a mais correta.

Tudo isso é para fazer meditar os seres sobre essa diversidade tão amada e tão
condenada ao mesmo tempo. É para fazer meditar cada coração e cada espírito sobre
o direito que se tem de julgar o que é feito na casa do outro.

Que direito se tem de passar por cima dos conceitos alheios e impor os seus?

Quem, eu pergunto:
quem tem a procuração de Deus com firma reconhecida (como já
o exigia o poeta), dizendo que é o “senhor da verdade” sobre o que é ou o que não é a umbanda e parte da Umbanda?

Quem pode se arvorar em predileto de Deus, eleito para ditar aos homens a verdade?
Nem os Guias o fazem!

Cada guia, à sua época, conforme a necessidade e a capacidade de compreensão dos
que ali se apresentavam ou para suas casas eram encaminhados, de acordo com a
sua proposta de trabalho -decidida no e pelo Astral- fez as suas colocações e lançou o
que em suas casas/tendas/terreiros seria a base de sua magia, qual a filosofia seria
seguida por sua linha teológica.

O que todos tem em comum é o Amor ao Pai e “ao próximo como a si mesmo”, o
respeito pelas Leis Divinas, o trabalho com espíritos para a prática da caridade e a
busca da evolução. Isso é Umbanda!

Simples, humilde, diversificada, unida sim, não pela foram de ritual externo nem pelo
tipo específico de uso magístico, mas pela sal missão: Fazer a caridade sem
preconceitos, sem elitismo, sem condicionantes outras que não sejam o Amor, a Fé, a
vontade de Evoluir, e praticar a caridade permitindo que os espíritos se manifestem e
trabalhem pelo bem, seu e do outro. Fazendo de seus adeptos, mormente os médiuns, seres participativos, integrantes e integrados na umbanda, e responsáveis pelo que fazem Nela, com Ela e por Ela.

Cristina Zecchinelli
em: 05 e 06/07/2007
GREOO - Grupo Espírita Obreiros de Oxalá
Av. Dom Hélder Câmara, 7.508 Fds

Retirado do: Correio da Umbanda
Edição 19 – Julho de 2007

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